Viver sem tempos mortos
A impressão que eu tenho é de não ter envelhecido, embora eu esteja instalada na velhice. O tempo é irrealizável. Provisoriamente, o tempo parou para mim. Provisoriamente.
Mas eu não ignoro as ameaças que o futuro encerra, como também não ignoro que é meu passado que define a minha abertura para o futuro. O meu passado é referência que me projeta e que eu devo ultrapassar. Portanto, ao meu passado eu devo o meu saber e minha ignorância, as minhas necessidades, as minhas relações, a minha cultura e o meu corpo. Que espaço o meu passado deixa para a minha liberdade hoje? Não sou escrava dele.
O que eu sempre quis foi comunicar da maneira mais direta o sabor da minha vida. Unicamente, o sabor da minha vida.
Acho que eu consegui fazê-lo. Vivi num mundo de homens guardando em mim o melhor da minha feminilidade. Não desejei nem desejo nada mais do que viver sem tempos mortos.
Simone de Beauvoir
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